80's Bits XXIX

O 80’s Bits está de volta e desta vez regressa com séries também! Relembramos o coelho mais hiperactivo da sétima arte; o mestre do “desenrascanço” do pequeno ecrã; o grito de um duo que quis mandar no mundo da música e três monstros que deixam cidades em escombros.

Filme: ‘Quem Tramou Roger Rabbit?’Who Framed Roger Rabbit (1998)

Na realidade alternativa de Hollywood dos anos 40, uma época em que seres humanos e personagens de desenho animado existiam lado a lado, Roger Rabbit (voz de Charles Fleischer) desconfia dos rumores de infidelidade de Jessica Rabbit (voz de Kathleen Turner), a sensual boneca animada com quem casou. Decidido a descobrir a verdade, o coelho contrata o detective humano Eddie Valliant (Bob Hoskins) para a vigiar. Porém, depois de uma série de mal-entendidos, Roger acaba acusado de homicídio e tem de provar a sua inocência enfrentando a ira do juiz Doom (Christopher Lloyd), um homem implacável que ganhou fama por detestar desenhos animados.

A Walt Disney Productions comprou os direitos cinematográficos do romance ‘Who Censored Roger Rabbit?’, do escritor Gary K. Wolf, pouco tempo após a sua publicação em 1981. Ron Miller, então presidente da Disney, viu o livro como uma oportunidade perfeita de produzir um grande sucesso comercial e de impulsionar o departamento de animação do grupo. O projecto foi, no entanto, considerado muito caro de colocar em prática e só em 1985, com a entrada de Michael Eisner como CEO e a colaboração da produtora Amblin Entertainment, é que teve luz verde para avançar. Jeffrey Price e Peter S. Seaman escreveram o argumento, que se afastou do tom mais sombrio da obra de Wolf, para dar luz a uma comédia de fantasia. O norte-americano Robert Zemeckis foi contratado como realizador e ao canadiano Richard Williams coube a tarefa de dirigir as sequências de animação.

Lançada sobre o selo da Touchstone Pictures, uma companhia da Walt Disney Pictures que distribuía filmes mais adultos, ‘Quem Tramou Roger Rabbit?’ não foi a primeira obra a apresentar um híbrido entre imagem real (a chamada live-action) e animação tradicional mas terá sido a mais popular e bem-sucedida do género na história do cinema. Para o efeito, o produtor executivo Steven Spielberg conseguiu convenceu várias companhias concorrentes da Disney (entre elas a Warner Bros e a Universal) a “emprestarem” as suas personagens para entrarem no filme, mediante equivalência de tempo de ecrã. Como curiosidade, é, até à data, a única vez que o Rato Mickey e Bugs Bunny partilharam uma cena. Orçamentada em cerca de 50 milhões de dólares, o que fez da longa-metragem a mais cara de sempre até então, a obra de Zemeckis arrecadou mais de 350 milhões nas bilheteiras por todo o mundo a acabou galardoada com três estatuetas douradas na cerimónia dos Óscares de 1989.

Quando ‘Quem Tramou Roger Rabbit?’ estreou em Portugal, por volta do Natal de 1988, não tive oportunidade de ir ao cinema e esperei que chegasse à televisão, dois anos depois. Nessa altura já tinha a cassete VHS pronta para gravar o filme, que revi várias vezes. Ainda hoje é o mais perfeito exemplo de fusão de desenho animado com imagem real, uma obra única (apesar da Disney já ter expressado por várias vezes no passado a intenção de produzir uma prequela ou sequela da mesma) com toques de film noir e um humor desvairado e irresistível que apela a miúdos e graúdos.

Série: ‘MacGyver’ (1985-1992)

Angus MacGyver (Richard Dean Anderson) é um agente secreto que trabalha para a Phoenix Foundation, uma instituição de pesquisa e empreiteira do governo norte-americano. Recrutado pelo director de operações Pete Thornton (Dana Elcar) e passando a reportar ao mesmo, "Mac" é uma espécie de solucionador de problemas. Muito versátil e possuidor de um conhecimento enciclopédico de ciências físicas, MacGyver resolve problemas complexos ao criar coisas a partir de objetos comuns, grande parte das vezes com a ajuda do seu canivete suíço. Prefere resolver as suas missões sem violência e não gosta de usar armas de fogo devido a uma morte acidental que envolveu um de seus amigos de infância.

Criada pelo produtor Lee David Zlotoff, a série estreou no canal norte-americano ABC em 1985 e registou números modestos de audiência na sua temporada inaugural, tendo disparado a partir do segundo ano e expandido a sua difusão por mais de 70 países um pouco por todo o mundo. 'Macgyver' chegaria ao fim em 1992, no término da sua sétima temporada mas devido à demanda popular, dois filmes para televisão foram criados, ambos lançados em 1994. A primeira longa-metragem, 'MacGyver: Tesouro Perdido da Atlântida', estreou nos Estados Unidos em Maio e foi rodado na Inglaterra e na Grécia. Já o segundo filme, recebeu o nome original de 'MacGyver: Trail to Doomsday'. Anderson actuou como produtor executivo de ambos os filmes, que foram filmados em vários locais da Europa.

A popularidade da série e principalmente da personagem que lhe dá o nome levou mesmo a que dicionários da Oxford admitissem o verbo "to MacGyver" nas suas edições em 2015 como significando "manufacturar ou reparar (um objecto) de forma improvisada ou inventiva, utilizando quaisquer itens que estejam à mão”. Os argumentistas da série basearam as invenções em ideias de consultores científicos, eventos reais e itens encontrados nos locais de rodagem (tanto nos estúdios internos quanto nas gravações externas). A ABC chegou mesmo a oferecer um prémio monetário a pessoas que enviassem sugestões de truques para a personagem de Anderson realizar na série. O actor reformou-se da pele do agente secreto em 2006 após um anúncio para a MasterCard e passou o testemunho ao jovem Lucas Till para o reboot de ‘MacGyver’ (2016-2021), que não obteve nem de perto o sucesso e a relevância da série original.

Em Portugal, 'MacGyver' fez a sua estreia na RTP1 em 1989, sendo transmitida aos domingos pelas 19h00, e continuou pelo canal até meados da década seguinte. A série rapidamente despertou a minha atenção e levou-me a incorporar as "engenhocas" de "Mac" nas minhas brincadeiras de criança, ao mesmo tempo que cantarolava o início do memorável tema do genérico, da autoria de Randy Edelman. Também por cá, "MacGyver" passou a marcar presença entre o léxico popular para caracterizar uma situação em que alguém rapidamente inventa uma solução de recurso, muitas vezes pouco convencional, para resolver determinado problema. Tendo em conta que em Portugal nos orgulhamos de dominar a arte de "desenrascar" (que pode ser visto como uma virtude ou um defeito, na verdade), uma solução "à Macgyver" faz todo o sentido.

Álbum: ‘Songs from the Big Chair’ – Tears for Fears (1985)

Os Tears for Fears são uma banda britânica de pop rock constituída pela dupla Roland Orzabal e Curt Smith. Os dois formaram o conjunto Graduate em 1978, que se manteria em actividade e sem grande sucesso até 1981 quando a dupla decidiu fundar os Tears for Fears. Originários de Bath, no sudoeste de Inglaterra, Orzabal (guitarra) e Smith (baixo) recrutaram Ian Stanley (teclados) e Manny Elias (bateria) para compor a banda, com os fundadores a partilharem as responsabilidades vocais. O álbum de estreia, intitulado ‘The Hurting’, foi lançado em 1983 e torná-los-ia imediatamente populares no Reino Unido, tendo alcançado o primeiro lugar na lista de discos mais vendidos no território.

A sempre difícil sucessão a um primeiro álbum de sucesso surgiu em 1985 através de ‘Songs from the Big Chair’. O segundo trabalho de originais dos Tears for Fears traduziu-se por um afastamento significativo do synth-pop sombrio e introspectivo do seu antecessor, apresentando um som pop rock mais mainstream, baseado em uso de guitarra, produção mais sofisticada e diversas influências estilísticas, enquanto as letras de Roland Orzabal e Curt Smith exibiam temas sociais e politicamente conscientes. O álbum tornar-se-ia o mais vendido de sempre da carreira da banda, atingindo o lugar cimeiro de vendas nos Estados Unidos e registando vendas globais na ordem dos 9 milhões de cópias transacionadas.

‘Songs from the Big Chair' originou cinco singles, lançados pela seguinte ordem cronológica: ‘Mother’s Talk’, ‘Shout’, ‘Everybody Wants to Rule the World’, ‘Head over Heels' e ‘I Believe’. De todas as canções, as que tornaram os Tears for Fears umas estrelas nos anos 80 foram ‘Shout’ e, principalmente, ‘Everybody Wants to Rule the World’, que acabaria por arrebatar o prémio de Melhor Single nos Brit Awards de 1986. Escrita por Orzabal, Stanley e pelo produtor Chris Hughes, a canção interpretada por Smith é um claro exemplo musical do estilo new wave e synth-pop característico do seu tempo com a letra a abordar o desejo que os humanos têm de controlo e poder. A banda lançaria o seu terceiro álbum em 1989, denominado ‘The Seeds of Love’ mas discordâncias entre os dois fundadores durante a digressão que se seguiu levou a que a dupla só voltasse a trabalhar junta em 2004, com o lançamento de ‘Everybody Loves a Happy Ending’.

Já conhecia a música dos Tears for Fears desde que as canções ‘Shout’ e 'Everybody Wants to Rule the World'(EWTRTW) foram divulgadas nas rádios e através de telediscos nos programas de televisão dedicados ao efeito mas foi quando o meu irmão mais velho comprou em 1992 a colectânea ‘Tears Roll Down (Greatest Hits 82–92)’ em CD que fiquei verdadeiramente fã da banda. A minha ideia para a rubrica era destacar este mesmo álbum, pela quantidade de músicas que gosto e que me marcaram, mas o facto de ser uma compilação de canções dos anos 80 lançada em plena década de 90 deixou-me um dilema sobre onde encaixaria melhor. Optei por eleger ‘Songs from the Big Chair', que foi um álbum que descobri posteriormente, e que contém algumas das minhas predilectas como “EWTRTW” e ‘Head over Heels’.

Videojogo: ‘Rampage’ (1986)

Em ‘Rampage’, os jogadores controlam um trio de monstros: George, Lizzie e Ralph, humanos transformados em criaturas devido a vários contratempos experimentais. O objetivo é destruir cidades e combater as forças militares, evitando ser abatido. O jogo passa-se durante 128 dias em cidades dos Estados Unidos da América, com cada ciclo repetindo-se cinco vezes. A jogabilidade inclui destruir edifícios, comer humanos e evitar danos.

Desenvolvido pela Bally Midway e distribuído por várias companhias para um largo número de plataformas, ‘Rampage’ foi buscar a sua inspiração aos filmes de monstros. George é um gorila gigante ao estilo de King Kong, Lizzie assemelha-se a um réptil colossal tipo Godzilla e Ralph é uma espécie de lobisomem descomunal. Os monstros devem reduzir a escombros todos os edifícios de uma cidade para avançar para o próximo nível, devorando pessoas e destruindo helicópteros, tanques, táxis, carros de polícia, barcos e eléctricos ao longo do caminho.

Alavancado pela possibilidade de ter três jogadores em simultâneo, o jogo foi um sucesso financeiro nas máquinas de arcade e acabou convertido para várias plataformas, como Sega Master System, NES, Atari Lynx, Amstrad CPC, ZX Spectrum, Commodore 64, Amiga, Atari ST, Atari 2600, Atari 7800, e IBM PC. Para além disso gerou cinco sequelas e uma longa-metragem de 2018 intitulada ‘Rampage: Fora de Controlo’. O filme segue o primatologista Davis Okoye (Dwayne “The Rock” Johnson) que vê o seu amigo gorila sofrer mutações que o deixam gigantesco, e o primata eventualmente acaba por causar o caos junto de um lobo e um crocodilo igualmente mutantes.

A única versão que joguei foi a do ZX Spectrum e, tendo em conta as capacidades da máquina, estava bastante aceitável. Com boa definição gráfica, muita cor e efeitos sonoros simples mas adequados, a versão para o microcomputador de 8 bits reteve a possibilidade de três jogadores ao mesmo tempo, podendo os mesmo partilhar o teclado ou juntar-se um ou dois joysticks. Nunca cheguei ao fim do jogo nem nada perto disso mas foi sempre divertido jogar ‘Rampage’, especialmente com amigos, por ser diferente e não encaixar facilmente num único género.